O Sol no Tarot: o Arcano XIX e o despertar da consciência luminosa

Descubra o significado profundo do Arcano XIX – O Sol no tarot. Entenda como essa carta simboliza clareza, alegria e iluminação espiritual segundo Rachel Pollack em A Bíblia Clássica do Tarot. Um mergulho na consciência solar e na união dos opostos.

TAROT

Nykalios

11/5/20256 min read

Arcano XIX - O Sol. Tarot de Rider Waite.

O Sol no Tarot: o Arcano XIX e o despertar da consciência luminosa

Há cartas no tarot que parecem respirar por conta própria. O Sol é uma delas. Ele não grita, não promete, não ameaça. Apenas brilha. E, ainda assim, esse brilho muda tudo.

Imagine o instante exato em que a noite cede, e o primeiro raio toca a pele fria de quem caminhou na escuridão. É isso que o Arcano XIX representa, não apenas um novo dia, mas o reencontro da alma com sua própria clareza.

Talvez por isso Rachel Pollack tenha dito, em seu monumental A Bíblia Clássica do Tarot, que O Sol não é uma simples carta de alegria, mas o ápice da consciência humana, a fusão entre o que fomos e o que finalmente compreendemos ser.

Entre dois mundos: da Lua à Luz

Toda jornada solar começa com a travessia da sombra.
No tarot, o Sol surge depois da Lua, e essa ordem é mais do que simbólica, é iniciática.

A Lua representa o território do inconsciente, o domínio das ilusões, o eco das emoções mal compreendidas. Quando o consulente extrai o Sol após a Lua, há ali uma narrativa silenciosa: a verdade vem depois da dúvida; a luz, depois do medo.

Rachel Pollack descreve esse momento como a passagem da percepção noturna, instintiva, fragmentada, para a clareza consciente. O Sol é, portanto, o ponto em que o ser humano desperta de suas próprias fantasias e enxerga o real sem filtros.

E, curiosamente, esse despertar não dói.
Ele aquece.

A imagem que cura

Nas versões mais antigas do tarot, como o de Marselha, vemos duas crianças sob o brilho solar, tocando-se ou brincando diante de uma parede. Já no Rider-Waite-Smith, o símbolo se transforma: surge uma única criança nua, montada num cavalo branco, empunhando um estandarte vermelho.

Duas versões de uma mesma verdade.

Pollack observa que, enquanto Waite e Pamela Colman Smith enfatizam a pureza e espontaneidade, o tarot de Marselha fala em integração: duas figuras, duas metades da alma, dois princípios que se reencontram.
É o retorno do masculino e do feminino à unidade, o casamento interno da razão e do instinto, do consciente e do inconsciente.

O Sol, então, é menos uma luz externa e mais uma fusão interna.
Não é algo que vem do céu. É o brilho que se acende no corpo inteiro quando tudo volta a fazer sentido.

O símbolo da união e do perdão

Rachel Pollack, com seu olhar mitopoético, associa o Sol à cena final do conto de Rapunzel: quando as lágrimas da heroína curam os olhos do príncipe e, ao se reencontrarem, ambos descobrem que tiveram filhos durante o exílio.

A metáfora é precisa: as lágrimas (água lunar) restauram a visão (fogo solar).
O amor e o perdão reconstituem a visão espiritual.

Essa imagem ecoa uma verdade essencial: nenhuma iluminação é completa sem vulnerabilidade.
A claridade do Sol não nasce do orgulho, mas da humildade de quem já se perdeu.

Em outras palavras: ninguém chega à luz sem antes ter amado o escuro.

O Sol através da história do tarot

Pollack recupera, em seu estudo histórico, as interpretações do Sol ao longo dos séculos:

  • Antoine de Mellet (1781): o Sol como criação divina, união do homem e da mulher.

  • Paul Christian (1870): a Luz Brilhante, símbolo da Verdade Suprema.

  • Golden Dawn (século XIX): “Senhor do Fogo do Mundo”, arquétipo da glória e da vitalidade.

  • Arthur Edward Waite (1910): felicidade, realização e sucesso em todas as áreas da vida.


Mas Rachel Pollack redefine essa tradição: o Sol é a consciência que reconhece a si mesma.
Não é apenas a recompensa, é o despertar.

A letra Resh e o caminho da lucidez

Na cabala hermética, O Sol corresponde à letra Resh (ר), “cabeça”.
Ela representa a razão, a consciência e o poder de perceber.

Resh liga duas sephirot: Hod (Glória, o intelecto) e Yesod (Fundamento, o inconsciente).
O Sol, portanto, é o momento em que a mente ilumina o inconsciente, transformando-o em solo fértil.

Pollack descreve esse ponto como a união entre pensamento e instinto, a sabedoria que nasce da integração, não da negação.

A criança e o retorno ao essencial

A criança do tarot é o símbolo do reencontro com a essência.
Sua nudez representa a verdade; o cavalo branco, o corpo reconciliado; o estandarte vermelho, a energia vital dirigida pela alegria.

Pollack vê nela o espírito reintegrado, que volta a brincar com o mundo após compreendê-lo.
É o arquétipo do renascimento solar, a inocência consciente.

Em cada leitura, essa carta nos pergunta silenciosamente:
Você ainda sabe brincar com a vida?

A numerologia do Sol: o ciclo que retorna

O número 19 reduz-se a 10 (A Roda da Fortuna) e depois a 1 (O Mago).
Assim, o Sol fecha o ciclo e o recomeça, o fim que retorna ao início.

É o momento em que toda experiência se transforma em sabedoria.
O buscador volta a ser criador.

Pollack chama isso de “a magia que retorna à simplicidade”: depois da tormenta, a calma; depois da busca, a presença.

A tríade Hierofante – Enforcado – Sol

O Sol integra uma tríade vertical com o Hierofante (V) e o Enforcado (XII).
O Hierofante ensina; o Enforcado se entrega; o Sol compreende.

É a síntese do aprendizado espiritual: a sabedoria que não precisa mais ser dita, porque foi vivida.

Em termos humanos, é quando a alma deixa de buscar permissão para brilhar.

O Sol nas leituras de tarot

O Arcano XIX é sinônimo de clareza, sucesso e vitalidade.
Na saúde, representa força e cura; no amor, confiança e reciprocidade; no trabalho, reconhecimento e expansão.

Mesmo invertido, o Sol não se apaga, apenas se encobre.
São “nuvens que passam diante da luz”, diria Pollack.

Um lembrete de que a verdade pode se ocultar, mas jamais desaparece.

O Sol e a era da hiperexposição

Em tempos de telas e excesso de luz artificial, o Sol do tarot nos convida a outro tipo de brilho, aquele que não precisa ser visto para existir.

É a luz silenciosa da autenticidade, que nasce quando deixamos de competir pela atenção do mundo e simplesmente nos tornamos inteiros.

A criança solar não exibe. Ela vive.

Talvez essa seja a revolução espiritual do nosso tempo: brilhar sem precisar provar.

O Sol também fere

Nem toda claridade é confortável.
A luz revela o que a sombra escondeu, inclusive nossas incoerências.

Em leituras profundas, O Sol pode simbolizar verdades que se tornam inevitáveis.
É a hora de olhar sem desviar.

Pollack lembra que a iluminação exige coragem.
Ver claramente é o dom e o fardo do Sol.

O Sol como meditação

Em A Bíblia Clássica do Tarot, Pollack propõe a meditação The Sun Spread, uma prática simples e transformadora:

  1. O que está claro em minha vida?

  2. O que ainda está nublado?

  3. O que me ajuda a ver melhor?

  4. O que me confunde?

  5. Como posso simplificar minha existência?


Essa reflexão devolve ao tarot seu propósito original:
não prever, mas revelar.

Apolo e a mente que ilumina

O Sol tem rosto antigo.
É Apolo com sua lira dourada, deus da razão e da arte, da cura e da precisão.

Como Apolo, o Sol do tarot cura pela visão, mas também fere quando necessário.
Sua luz é amorosa e implacável ao mesmo tempo.

Rachel Pollack observa que essa é a essência da consciência solar: a verdade que liberta porque mostra tudo.

O instante em que o mundo sorri

O Arcano XIX é a celebração da lucidez.
Não é a promessa de felicidade, mas o estado natural de quem deixou de se esconder.

Rachel Pollack resume: “O Sol é a simplicidade luminosa.”
É a alegria que não depende de circunstâncias, o olhar sereno de quem entende o próprio caminho.

No fim da jornada, o tarot nos devolve à pureza do início, e o Sol nos lembra que a luz sempre esteve aqui, mesmo quando não víamos.

O Sol é o sorriso da alma desperta.
E talvez, ao tirar essa carta, a pergunta mais honesta seja:

O que em mim finalmente quer nascer à luz?